O STF, a inclusão e a qualidade do ensino no Brasil

Por Christiane Aquinodiplomata, co-fundadora do Movimento Down
Por Luciano Inácio de Souzaadvogado, associado do escritório Souza, Cescon, Barrieu e Flesch Advogados
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela improcedência da Ação Direta de Constitucionalidade (ADIN) nº 5.357, proposta pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino – a COFENEM. Nesta ADIN, a Confederação questionou a obrigatoriedade das escolas privadas de receber e educar, sem custos adicionais, alunos com deficiência na mesma classe que alunos sem deficiência, conforme determina a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), aprovada pelo Congresso Nacional em 2015. Em outras palavras, para o STF, a determinação da LBI é constitucional.
A Lei foi criada para internalizar no sistema jurídico brasileiro a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU, ratificada pelo País em 2009. Essa Convenção, que é o primeiro tratado de direitos humanos a ter no Brasil equivalência à própria Constituição Federal, representa um grande avanço em matéria de política social, incluindo um maior comprometimento do País com a inclusão educacional de estudantes com deficiência.
Contudo, a decisão do STF traz implicações não apenas quanto ao direito dos alunos com deficiência. Ao alterar o paradigma de inclusão nas escolas brasileiras, influencia diretamente na qualidade de ensino para todos no Brasil.
Mesmo com a disposição na Constituição Federal de que todas as crianças, independentemente de cor, religião, sexo ou possuir deficiência, tem direito à educação regular, o que se via, na prática, era a constante negação da educação inclusiva a crianças com deficiência, sobretudo intelectual e sensorial – como autismo, síndrome de Down e paralisia cerebral. O problema se tornou mais grave quando a negação de matrícula se tornou passível da aplicação de multa em muitos estados e no Distrito Federal. Como saída, as escolas privadas passaram a “fazer de conta” que ensinavam ao aluno “café com leite”, sem de fato qualificar seus profissionais, prover material de apoio ou adaptar o currículo escolar e os métodos de avaliação de desempenho da criança e do jovem com deficiência.
Crianças com deficiência têm direito de aprender e, dada a oportunidade com a devida acessibilidade, aprendem.
Essa não é apenas uma suposição. A melhora no aprendizado foi identificada em estudos científicos nacionais, realizado pela APAE de São Paulo, e internacionais, pela Down Syndrome Educational International, do Reino Unido. No estudo feito pelos ingleses foram comparadas 90 crianças com síndrome de Down: o primeiro grupo em escola regular e o segundo em escola especializada. Os resultados do estudo demonstraram que crianças com síndrome de Down aprenderam mais (aproximadamente 30%) e melhor em ambiente inclusivo, sobretudo em áreas essenciais à independência funcional do indivíduo, como comunicação (oral e escrita) e habilidades acadêmicas (incluindo leitura, escrita e aritmética).
O que se vê como resultado da inclusão de alunos com deficiência é uma sala de aula multifuncional e interativa, onde o conhecimento é partilhado para toda a modalidade de “aprendedor” (visual, auditivo, manipulador), independentemente de ter ou não deficiência. Ao invés da velha e monótona aula expositiva no quadro negro, as salas inclusivas necessitam de todo o material didático adaptado para receber alunos com deficiência.
E quem ganha com isso? Todos! Tanto o aluno com deficiência, que estará incluído no sistema de ensino, quanto o aluno sem deficiência, que terá acesso a maior diversidade de materiais e técnicas didáticas para aprender em um ambiente inclusivo, e, também de acordo com as pesquisas mais modernas em educação, com menor incidência de “bullying”.
Em um momento em que se observa um aumento do conservadorismo social e da intolerância no Brasil e em outras democracias, o STF passa a mensagem de que é necessário desconstruir preconceitos e estimular a convivência entre os diferentes. O Ministro do STF Edson Facchin, relator da ADIN, afirma em seu voto que conviver com a diferença não é direito dos diferentes apenas. É direito da maioria, de poder conviver com a minoria e aprender a desenvolver tolerância e acolhimento.
Cabe a todos fazer valer a decisão do STF e, junto com o governo federal, trabalhar com escolas públicas e privadas no aperfeiçoamento pedagógico de professores e coordenadores para a plena inclusão escolar.
As regras do jogo e os caminhos estão abertos para a construção de uma educação mais inclusiva e eficaz, que possa garantir um futuro mais justo e igualitário. Mãos à obra!
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