Ela fornece força para realizar projetos e mudanças. E o melhor: pode florescer em plena tristeza, quando o horizonte está repleto de nuvens e a gente acha que não existe mais saída.
Coração novo
Temos três alternativas básicas na maneira de olhar a vida: ou a consideramos plena, benfazeja e cheia de sentido, ou a vemos como triste e traiçoeira, ou a encaramos como uma mistura agridoce das duas coisas. As três maneiras têm o seu momento justo, mas aquela que nos aproxima mais do jeito de ser de uma criança é olhar para o mundo com um coração novo em folha. E o que quer dizer isso exatamente? É se colocar em estado de descoberta por tudo o que acontece. Jesus dizia que para entrar no reino dos céus é preciso ser como uma criancinha, isto é, retornar a um estado de pureza, de leveza, de inocência. Você já reparou que quando está alegre é capaz de rir de qualquer bobagem? Então, é preciso redescobrir o encantamento do que nos cerca. E isso depende de uma escolha. Para exercitar essa nova possibilidade, é possível começar com algo simples, como, por exemplo, deter sua atenção nos processos da natureza, como deitar no gramado e observar as formiguinhas. Procurar um arco-íris no céu depois da chuva. Contemplar os reflexos das manchas de óleo no asfalto. Toda vez que disser para si mesmo: “Que incrível! Que coisa fantástica!”, você estará mais próximo do deslumbramento que a alegria provoca no coração. E esse encantamento pode acontecer em qualquer condição. Há pessoas que passam por desafios dificílimos, que têm a vida cheia de obstáculos e que mesmo assim são alegres. Claro, também choram, também ficam tristes quando é o caso, mas na maior parte do tempo conseguem manter um sorriso no rosto. “Morei na Jamaica. Apesar da realidade dura do povo, sua música é vibrante e cheia de vida. É comum ver alguém rindo à toa na rua. Vemos também isso no Brasil, na Índia, no Senegal, e em outros países mais pobres, enquanto a tristeza e a depressão invadem países mais civilizados e frios”, diz Simone Vilhena, que acompanhou o marido empresário em vários países do mundo. “Não quero afirmar exatamente que o pobre é feliz e o que o rico é triste. Isso não é verdade. Quero dizer apenas que a alegria não depende tanto do mundo externo, mas sim do mundo interno, e da leitura que cada um faz do que acontece.” Isso mesmo. O que torna a alegria tão especial é que ela pode florescer em qualquer terreno, mesmo o mais desfavorável. É diferente da felicidade, que depende bastante de circunstâncias benéficas. O publicitário Antonio Soares atesta essa verdade. Depois de um relacionamento amoroso infeliz, e no meio de uma depressão, ele finalmente tomou coragem e convidou uma moça do seu grupo budista para sair. O que o encantou particularmente foi o sorriso dela, sua leveza. “De repente, ao cruzar a Avenida Paulista, nos demos as mãos. O toque, o calor, a intimidade desse pequeno gesto foram como um raio que atingiu meu coração e que me transportou instantaneamente para outro mundo, onde tudo estava certo, onde eu não precisava de mais nada, e que não hesitaria em chamar de Paraíso. Até hoje guardo a lembrança daquele momento. E sempre que o relembro meu coração se aquece e sorri de alegria.” Também é o que acontece com Aurélie Bredin, personagem principal do encantador livro O Sorriso das Mulheres (Record). Afundada em lágrimas diante do bilhete de adeus do namorado, ela sai sem rumo pelas ruas de Paris debaixo da chuva até chegar a uma livraria onde encontra um livro que imediatamente lhe devolve a alegria, e que mudaria toda a sua vida. Romancinhos água com açúcar e envolventes também são capazes de nos devolver a leveza e a esperança mesmo num dia triste.
Alegria x felicidade
Aqui chegamos a um ponto importante. “A pesquisa me ensinou que felicidade e alegria são experiências diferentes”, nos diz a pesquisadora Brené Brown em A Arte da Imperfeição (Novo Conceito). Brené afirma que, para seus entrevistados, a felicidade está ligada às circunstâncias, enquanto a alegria está relacionada ao espírito e à gratidão de estarmos vivos. “As duas experiências vão e vem. Ninguém é feliz ou alegre o tempo todo. Porém ambas são importantes para nós.” Mas há uma distância entre os dois sentimentos. Brené cita outra autora, Anne Robertson, que, em seus estudos feitos junto com a Sociedade Bíblica de Massachusetts, estabeleceu essa diferença. Anne diz que makarios, uma das palavras gregas usadas para felicidade, era empregada para descrever a despreocupação dos ricos, cumulados pela prosperidade, saúde e boa fortuna. Já a palavra chairo, usada para a alegria, significava o “apogeu do ser”. Para os gregos, chairo só poderia ser encontrado no plano divino, ou no exercício da virtude, e na expressão da sabedoria. Era alguma coisa a ser conquistada e que sinalizava o clímax de uma existência. Talvez esse algo inefável pudesse ser traduzido como júbilo, uma forma elevada de alegria, sentimento que surge quando o espírito está ligado a um nível espiritual superior. É um degrau acima da satisfação e do prazer mundanos, e talvez mesmo do contentamento comum. Os filósofos gregos da Antiguidade também afirmavam que o que nos dá essa alegria mais perene é o mundo das virtudes, o universo do ser, uma afirmação bem distante da nossa realidade de consumidores, em que o ter e o ostentar é o que importa. Mas pense bem se eles não têm razão: uma visão mais espiritual e menos ambiciosa da existência, além de mais tranquilidade, simplicidade, generosidade e compaixão certamente nos deixam mais relaxados por mais tempo. E mais felizes. Já a alegria efêmera nascida do ter, se consome rapidamente. Para a pesquisadora americana Brené Brown, algumas condições nos impedem de ser mais alegres. É interessante, e nos ajuda muito saber quais são elas. Vamos ver no próximo bloco.
Medo, escassez e incerteza
Você já ouviu a frase “é melhor não ficar alegre agora para não me decepcionar depois”? Ou “não vou ficar muito alegre porque não sei se vai durar”? Bom, elas traduzem o “medo de ser feliz” e impedem a expressão plena do amor, indicam o medo da perda e apenas atrapalham a vida. Não as empregue mais. Pense que é merecedor de eventos felizes e apenas seja grato pela abundância em que ocorrem em sua vida. Outro obstáculo, segundo Brené, é a sensação de escassez crônica. Ela é bem explícita nas palavras de Lynne Twist no livro A Alma do Dinheiro: “Para mim e para muitos de nós, nosso primeiro pensamento do dia é ‘não dormi o bastante’. O próximo é ‘não tenho tempo o bastante’”. Verdadeiro ou não, o pensamento de ‘não o bastante’ nos ocorre automaticamente antes que possamos questioná-lo ou examiná-lo. Assim, passamos a maior parte das horas e dos dias de nossa vida ouvindo, explicando, reclamando ou nos preocupando porque ‘não temos o bastante de’. Não somos magros o bastante, não somos bonitos o bastante, não somos ricos o bastante, enfim a lista é longa e traduz um sentimento crônico de escassez. “Antes mesmo de nos sentarmos na cama, antes mesmo que nossos pés toquem o chão, nos sentimos insuficientes, já ficamos para trás, já nos falta alguma coisa”, diz Lynne. “E, quando vamos para a cama, a cabeça remói uma ladainha de coisas que não conseguimos, ou que não fizemos naquele dia. Vamos dormir oprimidos por esses pensamentos e acordamos em devaneios de carência.” Ora, quem pode ser alegre assim? Gratidão e reconhecimento pelo que já temos e uma atitude mental de suficiência ajudam muito a esvaziar essa sensação. A escritora e líder Marianne Williamson escreveu: “Alegria é o que nos acontece quando nos permitimos reconhecer como as coisas são realmente boas”. Outro impedimento é, acredite, o nosso desejo de manter uma imagem construída perante nossos pares. Isso consome uma energia enorme. E nos tira a espontaneidade e a alegria, principalmente quando queremos aparentar ser cool (descolados) e manter um olhar blasé (entediado) para a vida. Desfazermo-nos de modelos copiados da mídia ou de quem admiramos também ajuda. O último obstáculo é a nossa eterna ânsia de certezas. Só posso ser alegre se o relacionamento der certo mesmo. Só posso ser feliz se ele provar sua lealdade até o fim. Gente, pelo amor de Deus, a vida é incerta, e ninguém tem garantia de nada. Damos um voto de confiança, não perdemos a alegria, e, se nos enganamos, nos enganamos e pronto. A frustração e a desilusão vêm no pacote. Não dá para evitar. Agora você sabe alguns dos segredos que podem trazer mais alegria à sua vida. Talvez fosse bom ler de novo o texto, ou anotar o que for importante. Espero que essas sugestões possam torná-lo mais relaxado, alegre e feliz, como aconteceu comigo.
LIANE ALVES tem a alegria de morar com Antonio numa casinha no alto de uma montanha.
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